Proibido desistir

Quando há sensivelmente uma década atrás, ainda no afamado Highbury, o Arsenal derrotava um Leicester já despromovido no último dos testes para a "Missão Invencível" - concluído, assim, de forma exímia -, jamais se imaginaria as circunstâncias dos encontros seguintes entre as duas equipas. Quase onze anos após esse confronto final, e com Arsène Wenger como único dos protagonistas a resistir à passagem do tempo, ambos voltam a cruzar-se num jogo de elevada carga emocional. Os Gunners, tal como em 2004, poucos meses antes de um Europeu que uniria Portugal como nunca, estão obrigados a triunfar. Só que desta, não para defender qualquer recorde, mas para manter intactas as aspirações de conquistar um título ganho pela última vez precisamente há doze anos. E o líder, porque a história faz questão de apresentar contornos épicos, é o Leicester. Se em Bournemouth dois minutos foram suficientes para resolver a questão, a Epopeia Leicesteriana continua a acumular episódios mágicos e o mais recente dissipou quaisquer dúvidas ainda existentes no que toca à qualidade do produto. Ao contrário do que se pudesse estar à espera, os Foxes entraram com todo gás na recente visita ao Etihad e foram cedo coroados com um golo. Contudo, nessas circunstâncias, e ainda por cima na condição de visitado, é impossível não reconhecer o demérito do City - dois dos golos foram sofridos na sequência de bolas paradas, notando-se erros de marcação gritantes. Citizens que se mostraram desinspirados - De Bruyne faz muita falta - para no resto da partida perfurarem uma defesa contrária muito bem montada, acabando até por sofrer mais dois golos. Se esta sexta-feira decide-se muito daquilo que é a Liga Portuguesa e no sábado Juventus e Napoles testam o grande momento pelo qual passam um e outro, no domingo, quando todos os caminhos derem literalmente para Inglaterra - apenas pela sexta vez, os quatro primeiros classificados do momento jogam entre si no mesmo dia -, os Citizens estão obrigados a mostrar o melhor de si. Mas não será pêra doce. Pela frente terão um Tottenham que também vai espalhando magia ultimamente, com muita posse e um estilo altamente virado para o ataque, como de resto ficou patente na receção e vitória ante o Watford, mesmo que à tangente. É verdade que os Spurs não são uns underdogs à escala do Leicester, mas a sua presença nesta luta apenas vem corroborar a ideia de que esta é a Liga das Revelações. Marcará o "Super Sunday" uma mudança de paradigma ou apenas espelhará, uma vez mais, a realidade atual? Antevêem-se grandes espetáculos e desistir é uma palavra que não cabe em nenhum dicionário. Fazer previsões é sobejamente arriscado mas, e aqui vai uma, a equipa que melhor se mostrar dificilmente não será campeã. São de testes destes que são feitos os campeões, não apenas pelos resultados, como pela atitude.

Enquanto os candidatos ao título parecem estar delineados, apesar de na Premier League tudo poder-se alterar de um momento para o outro, outras lutas travam-se ao redor do país. O Manchester United, ainda a vislumbrar uma presença na Champions - ganhar a Liga Europa é outra das vias - para oferecer a Mourinho, voltou a empatar no clássico perante o Chelsea. Voltou a haver equilíbrio, com ligeiro ascendente para os Red Devils que deixaram fugir os três pontos no tempo extra. Mesmo assim, e pela sétima vez em oito, um encontro entre ambos os conjuntos regista a pobre marca de dois ou menos tentos apenas. Já do Chelsea de Hiddink, a melhor notícia é mesmo o estatuto de imbatível. Contudo, a qualidade de jogo parece curta para sequer incomodar um PSG ao melhor dos seus níveis na Liga dos Campeões. Mas o futebol é o momento e não há impossíveis. Sendo que o momento é de Southampton e Everton. Desde que goleou o Arsenal no Boxing Day que os Saints melhoraram exponencialmente e vêem traduzida essa evolução na tabela, ganhando também na transata jornada ao West Ham, mesmo que atuando com menos um homem por mais de meia hora. Já os Toffees deram uma lição no sempre difícil Britannia e finalmente começam a estabilizar-se defensivamente. Mais a baixo, na luta pela manutenção, o grande vencedor foi o Newcastle, que triunfou - 1-0  ao West Brom - e trocou de posição com o Norwich, estando agora fora do Bottom 3, ao passo que o Villa também somou os três pontos na busca pelo milagre - 2-0 aos Canaries. O Sunderland pode não ter ganho mas o empate num "Revoltado Anfield" - enorme contestação pelo aumento do preço dos bilhetes -, da forma como ocorreu, também teve o seu quê de delicioso. Por fim, nota para o empate em Gales entre Swansea e Crystal Palace. Se Guidolin é outro que ainda defende uma streak de jogos sem perder, os Eagles somaram o oitavo jogo consecutivo sem ganhar para a Liga - curiosamente, têm-se portado bem na Taça. Quem os viu e quem os vê.

Onze Ideal da Jornada 25 da Premier League: Čech (Arsenal); Trippier (Tottenham); Lescott (Aston Villa); Huth (Leicester); Yoshida (Southampton); Kanté (Leicester); Sigurdsson (Swansea); Cleverley (Everton); Firmino (Liverpool); Mahrez (Leicester ) e Diego Costa (Chelsea)
MVP: Huth (Leicester). Quem diria? O Leicester, com o decorrer do tempo, aprendeu com os próprios erros e a melhoria em termos defensivos é total mérito - mais um - de Ranieri.  Isto ficou claro no passado sábado, em que esteve inclusive no central alemão a chave da partida. Excelente aproveitamento da passividade a defender do City e o fechar de quaisquer espaços na sua defesa foram imagens de marca. Após anos e anos na sombra de outros, o alemão que está no Reino Unido há cerca de 15 anos, finalmente ganha outra preponderância e é o patrão da defesa do líder isolado do campeonato. 
Jogador a Seguir: Celina (Manchester City). O timing em que é lançado foi péssimo mas nota-se algo de especial no jovem norueguês. Sobretudo no que concerne à sua relação com a bola, com um toque já bastante requintado. Aliás, foi-lhe dada a responsabilidade de marcar as bolas paradas e é dele o cruzamento para o golo de Aguero. A derrota final dá traços de infelicidade a esta estreia que, no entanto, acaba por ter nota positiva. Já a Noruega, que também conta, entre outras, com promessas como Sakor (Juventus) ou Ødegaard (Real Madrid), tem aqui bases para no futuro emergir no panorama continental.
Treinador da Jornada: Claudio Ranieri (Leicester)
A Desilusão: Manchester City. Quem acompanhou as primeiras jornadas da equipa de Manchester - coesa atrás, compacta no meio-campo e mortífera no ataque - e assiste ao que se está a passar agora só pode se sentir desiludido. Pellegrini bem pode acusar os seus superiores de falta de ética na forma como anunciaram a contratação de Guardiola, mas a verdade é que a sua equipa regrediu a olhos vistos. Na passada ronda podiam ter assaltado a liderança mas apenas caíram para quarto.
Menção Honrosa: Pep Guardiola e José Mourinho. Fazendo homenagem ao inesquecível tema dos Kasabian que durante  alguns anos abriram o campeonato, I'm on Fire. Nem é para menos. Os dois treinadores mais marcantes da última década vão voltar a cruzar-se, e desta vez até vão partilhar a cidade. O espanhol, célebre pela forma como revolucionou a forma de jogar e a noção de posse, cumpre com a palavra e ingressa num campeonato que teoricamente será bem mais competitivo que o alemão. O português, vencedor-nato mesmo que em desprimor da estética e um estudioso para lá daquilo que são os 90 minutos, manifestou recentemente a vontade de permanecer em Inglaterra por sentir que "é onde se encontram os maiores desafios", sendo que já só falta a oficialização, com os rumores a intensificarem-se cada vez mais. Por enquanto, Ranieri e Pochettino são os técnicos em destaque.

Visão do Leitor (perceba melhor como pode colaborar com o VM aqui!): Marco Rodrigues

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